Uma tarde dessas, de céu azul e pequenas nuvens brancas, estava eu escrevendo a máquina, quando alguma coisa passou pela minha cabeça, então, a minha própria sede de informação guiou-me ao um passado bem distante. Eram duas horas da tarde de verão, quando Dona Dolores apareceu na porta da sua casa com uma vassoura de piaçaba que ganhou de presente de sua melhor amiga. A casa era simples, sem pintura, sem reboco, era tudo no tijolo, que estava jogado de qualquer maneira um em cima do outro. Parecia uma caixa de fósforos de tão pequena era a sua casa, no entanto, Dolores transbordava de alegria a todo instante, aliás, tinha o maior orgulho de sua casinha que ficava lá pelas bandas de Ouro Fino. Rosto redondo, enorme sorriso nos seus lábios vermelhos e usava também óculos de lentes bem grossas que lembrava dois fundos de garrafas. Passava horas andando de um lado para outro com a vassoura nas mãos, aliás, varria aquele chão de terra socada todo santo dia. E também cuidava de sete netinhos que dava o maior trabalho. Devoravam tudo que encontrava pela frente, comia as frutas que estava no cesto, abria a lata de leite em pó e derramava pela casa toda, e até um prato de canjica que estava dentro da geladeira os pestinhas não perdoou. Parecia formiga no açucareiro. Ainda sobrava tempo para tomar conta de sua horta, onde tirava algumas folhas de verduras que ajudaria na sustento da família. Trabalhadeira, sempre vivia olhando os botões de sua blusa de estampa florida que já estava toda amarrotada. Nesse dia Dolores estava conversando com sua amiga no quintal de sua casa, de repente, escutou-se um barulho que vinha do seu quarto e assim Dolores olhou para trás o mais rápido possível. Que susto! Eram aqueles pestinhas aprontando novamente uma das suas peraltices. Às vezes a deixava muito irritada, porém, não adiantava chamar atenção dos pestinhas, fazia pirraça. Por isso deixava muito furiosa. Certo dia Dolores deu um enorme berro, como se estivesse possuída por algo, e isso não adiantava coisa nenhuma e sempre ficava por isso mesmo. Depois de uma bela tarde de sol, não chovia há muitos e muitos meses, de modo que os animais ficavam inquietos, uns diziam que ia chover logo e outros diziam que não, e nunca chegavam a uma conclusão. Então, as chuvas começaram a cair por volta das 2 horas da tarde. Os primeiros sete pingos atingiram o telhado e escorriam até o chão. Num instante, aumentava o rumor das chuvas a cada segundo. Dona Dolores ficava pensando de onde vinha tanta água, e custava a crer que uma chuva dessas no sertão ajudaria muita gente. Pela janela ela viu várias luzes cortando o céu, era um trovão atrás do outro, que tremia toda parede de sua casa. Naquele momento tremulo, Dolores corria desesperadamente para esconder os talheres e cobrir com uma toalha o seu espelho da única penteadeira. Deveria ser um daqueles mitos que passavam de geração pra geração, ou uma neurose de uma pessoa que já passou dos 50 anos. Os sete pingos molhavam o chão da sua cozinha, pingava sem parar, lá havia uma geladeira toda enferrujada, no seu lado direito um gabinete com pia e alguns copos sujos. A chuva não ia parar tão cedo, então, Dolores pegou um bloco de papel que estava guardado dentro do armário, e assim, fez vários barquinhos de papel, com isso deixava os garotos tranquilos até a chuva passar. Mas os pestinhas não perderam tempo, arrastaram uma cadeira de madeira até a janela e logo subiram um de cada vez para jogar o seu barquinho na enxurrada que passava logo ali. Havia fileiras de barcos de papel e era a maior alegria da criançada. Essa minha infância. Que eu nunca vou esquecer.
Luciano
Junqueirópolis-sp
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